DIA 21 - ESTRELATO E VIGILÂNCIA, COM VÉNIAS À MISTURA


Percorrer o corredor é uma aventura para lá de desafiante. Tem até o seu quê suicida. Vai daí, decidi transformar essa experiência diária no meu momento de glória: não há alunos, nem corredor. Há admiradores que gritam e que se atropelam para me ver passar. Há nos seus rostos, bem sei, um desejo que quase roça a invejazinha, de quererem ser como eu. No chão, os que desmaiam de emoção. Contorno-os, cumprimento, e sigo em frente, com aquela expressão seráfica que só as grandes estrelas sabem ter. Percorro o imenso corredor, enquanto, estarrecida, ouço o clamor de quem, no seu anonimato, anseia pelo meu brilho.
Incontáveis “Olá Pressora”,  depois é o esticar de braços para um cumprimento , são os toques no ombro, a insistir numa proximidade tão ansiada, quanto impossível.”Professora?” - tenho-me perguntado, depois percebi, este tem sido o meu papel nos anos mais recentes.
- Ah, a confusão do público, que não distingue quem sou da personagem que represento!
Depois desta experiência, o momento da aula é de ansiedade, que apenas termina com o toque de saída, para poder novamente desfilar na passadeira vermelha da minha loucura. Que é grande.
Durante a aula da manhã, ainda com o cérebro em “stand-by”, a determinada altura, ouvi um comentário: “Adoro estas aulas”. Discretamente, olhei para o colega L., que tão bem me coadjuva, pensando vir dele tal expressão de apreço, mas não, ele estava ao fundo da sala, de joelho no chão a ajudar um petiz, foi quando me apercebi que tinha sido a T.. Percebi, naquele momento, que os milagres existem.
De volta à sala de professores, reparei num vulto indistinto (não tinha os óculos e havia em mim a desconfiança de que os tinha perdido), esse vulto, dizia eu, estava numa pose de “vou pôr-me aqui atrás deste poste para ninguém me ver”, esconderijo pouco feliz, pois até eu, que não vejo um palmo, me consegui aperceber da sua presença. À medida que me aproximava, descobri que era a P.G.(vénia), em busca dos infractores. Ficou atrapalhadíssima quando me viu. Não que mo dissesse, ou que se percebesse, mas acho que essa é a reacção certa quando se está na presença de uma estrela de cinema. Espreitava a T., disse-me, que já se tinha metido em sarilhos, sim, a T., que no outro dia escolheu ir à Direcção, em vez de ficar na aula de Português, que tanto adora.
Esta situação fez-me lembrar outra: no ano lectivo passado, tive um jovem aluno que me disse: “Oh pressora, eu sei onde ‘tão as camaras todas! Todas, pressora! A única coisa que não sei é de onde é que o Prof. F.N. e a Prof. P.G. me podem aparecer."
Fica a sugestão: esqueçamos as câmaras de vigilância, que estes professores e a D.ª F., com os seus 6 olhinhos, são muito mais eficazes!
À saída, a D.ª F., mal me viu no patamar das escadas, começou com uns salamaleques estranhos, de rabo p’ró ar, como quem faz uma vénia desengonçada e vá de se desculpar, por não ter posto um gosto na crónica de ontem,  gesto que muito apreciei. Agora só já falta a D.ª C. seguir-lhe os passos,  tal como a D. a S.G..
Espero não me estar a esquecer de ninguém, que eu cá não gosto de andar a melindrar as pessoas.


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