#diasquemefazemriregostardoquefaço

Atravessei a ponte e, mal entrei no bloco, foi isto:
"Pressora, pressora, coma lá! - eram umas alunas, que, num grito de desapego, me estendiam uma lancheira cheia de gomas, pastilhas e toda uma parafernália de coisas doces.
Parei de imediato e disse-lhes, ante o espanto da colega L.R., que me ladeava pela esquerda:
- Acho de muito mau tom que, sabendo que eu a fazer dieta, me venham oferecer coisas destas! 
- Mas vêm de França, pressora! - insistiram.
- Ah, se vêm do estrangeiro, é outra coisa! - respondi, que eu cá sou muito pelas boas relações internacionais - enquanto ia escolhendo o que mais me agradava. Mas não estava sozinha, a colega L.R. também aprecia a multiculturalidade e já estava também a subtrair pastilhas,  para gáudio das jovens alunas. 
Feito o corredor, essa travessia hercúlea, lá comecei a aula, da qual faz parte o A. M., dono de uma criatividade desmedida, só suplantada pela forma peculiar com que organiza a sua mesa de trabalho. Vai daí, a cada aula, lá vou eu, logo no início, simplificar-lhe tal tarefa. Hoje, porém, não o fiz. Ia já  num desembaraço de fazer inveja, quando me apercebi de que me tinha esquecido de dar um jeitinho à dita mesa.
- Oh, A., vamos lá arrumar a casa, que não gosto de desarrumação! Para isso já me basta o estado em que a minha às vezes anda...
Ouviu-se, então, do fundo da sala:
- Hashtag aspirador! - era o D.G., com o sorriso matreiro de quem sabia que me ia desarmar. 
Não pude deixar de reconhecer a pertinência do comentário, razão pela qual esbocei uma expressiva gargalhada, imediatamente seguida de um "Vamos lá continuar, que eu estou aqui é para trabalhar", que eu cá sou muito competente e não gosto nada de sorrir para os alunos, muito menos de esboçar gargalhadas.

A tarde foi calma, orações relativas, que é pitéu muito apreciado e informações sobre as apresentações orais que têm de fazer. A este propósito, fiz-lhes um brevíssimo apanhado sobre o conto que servirá de ponto de partida, que valeu o sonoro comentário do jovem A.
- Shi, já tou cheio de vontade de ler o conto, pressora! - exclamou, de olhar muito vivo.
Chego, portanto, à conclusão de que sou mesmo muito boa a fazer brevíssimos apanhados. 
Após o toque de saída, a M. e a N. vieram ter comigo para me mostrarem os seus telemóveis novos: uma folha dobrada, na qual desenharam um ecrã e um teclado e com a qual se comunicam. Ouçamo-las:
- Pressora, a gente finge que é bué bué burras e que 'tamos a falar uma com a outra. 
Pus o meu ar mais sério, porque isto de contrariar os moços pode correr mal para o nosso lado, peguei no Mancha Mobile e saí da escola, em busca de alguma sanidade.
Ainda não a encontrei.

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